Certa vez, numa reportagem de televisão sobre bóias-frias no interior de São Paulo, a repórter perguntou a um adolescente camponês:
- Você costuma sonhar?
- Não. Tenho só pesadelo.
O fundamental na resposta foi a compreensão fatalista, imobilista. A amargura da existência daquele adolescente era tão profunda que a presença dele no mundo virara um pesadelo uma experiência na qual era impossível sonhar. "Tenho só pesadelo" repetiu, como se insistisse em que a repórter jamais olvidasse o fato. Ele não via futuro para si.
Sem um vislumbre de amanhã, é impossível a esperança. O passado não gera esperança, a não ser quando se recordam momentos de rebeldia, de ousadia, de luta. O passado entendido como imobilização do que foi, gera saudade, pior, nostalgia, que anula o amanhã.
Quase sempre as situações concretas de opressão reduzem o tempo histórico dos oprimidos a um eterno presente de desesperança e acomodação. O neto oprimido repete o sofrimento do avô. É o que ocorre com as maiorias nordestinas deste país. Existencialmente cansadas, historicamente anestesiadas.
Paulo Freire em À Sombra desta Mangueira - Editora Olho Dágua, p. 31.
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